terça-feira, 30 de outubro de 2012

Demônios

Tenho medo constante. Como se estivesse sendo seguida, observada. Possuída. No escuro, não me basta acender uma vela e os demônios se esconderão. Me esperaram na porta do meu quarto, para onde vou correndo toda vez que escurece. É o meu refúgio. Onde meus santos estão livres do meu corpo e a alma pode tornar-se ânima. Meus deuses poetas estão libertos, mas o apelo às musas inspiradoras não os tem animado muito. São tantos os demônios na porta do meu quarto que a comunicação espiritual resulta ínfima. Da informação, eles colhem o que há de mais vivo, e o tártaro o deixam lá. Lá no Tártaro. É onde estão meus ânimos.
Sinto que os demônios conseguiram invadir meu bucólico campo, e não há mais ninfas que os queimem. Onde me esconder, onde me refugiar, se o bucólico já não o é mais. É urbano. Foi invadido. Nem em cantos amebeus sou capaz de desafiar os meus demônios. Nem em versos livres. Perdi meu argumento, minha oração, minha palavra. Agora sou gestos.
Muda, meus demônios não me acharão. E se me virem andando pelos clarões da cidade, eu, sem voz, não me possuirão. Dentro de mim, é onde me resta ânima.

domingo, 28 de outubro de 2012

Gustavo Adolfo Bécquer 2

Rima XXIII

Por una mirada, un mundo ;
por una sonrisa, un cielo ;
por un beso... yo no sé
que te diera por un beso.



Do livro: Rimas

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Nostalgia

Recordar a nostalgia são releituras das lembranças de anos ou de ontem. Nostalgia é um sentimento só, assim como o ser é um só e a percepção é uma só. Não existe comparação sem o elemento comparativo, assim como não existe a comparação de elementos não diacrônicos. A questão é a sincronia de momentos que torna uma comparação em metáfora. A questão da nostalgia é a sutileza de retomar sentenças antigas e fazê-las clássicas. O amor de outrora não é mais o de hoje. A cumplicidade de outro ano não é mais cúmplice de uma amizade. É a sutileza de fazer uma anáfora seguir sendo simples e intensa. A simplicidade de fazer uma aliteração implícita. É o silêncio do externo que ecoa feito consoantes numa cabeça veloz.