quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Paulo Leminski

Distâncias mínimas

um texto morcego
se guia por ecos
um texto cego
um eco anti anti anti antigo
um grito na parede rede rede
volta verde verde verde
com mim com com consigo
ouvir é ver se se se se
ou se se me lhe sigo?

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O mínimo do máximo

Tempo lento,
espaço rápido,
quanto mais penso,
menos capto.
Se não pego isso
que me pega no íntimo,
importa muito?
Rapto o ritmo.
Espaçotempo ávido,
lento espaçodentro,
quando me aproximo,
simplesmente disfarço,
apenas o mínimo
em matéria de máximo.

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Signo ascendente

Nem todo espelho
reflita este hieroglifo.
Nem todo olho
decifre esse ideograma.
Se tudo existe
para acabar num livro,
se tudo enigma
a alma de quem ama!

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Merda e ouro

Merda é veneno.
No entanto, não há nada
que seja mais bonito
que uma bela cagada.
Cagam ricos, cagam padres,
cagam reis e cagam fadas.
Não há merda que se compare
à bosta da pessoa amada.

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"O ideograma de kawa, 'rio', em japonês, pictiograma de um fluxo de água corrente, sempre me pareceu representar (na vertical) o esquema do haikai, o sangue dos três versos escorrendo na parede da página..."

amei em cheio
meio amei-o
meio não amei-o

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rio do mistério
que seria de mim
se me levassem a sério?

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choveu
na carta que você me mandou

quem mandou?

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temporal

fazia tempo
que eu não me sentia
tão sentimental

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tudo dito,
nada feito,
fito e deito





Do livro: Distraídos venceremos

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